No Café

café

Barulho. O café estava cheio. Cheio demais. Muita gente junta, conversando. Encontro meu caminho por entre elas e acho um lugar ao balcão. Surpreendo-me ao perceber a máquina de café coberta por um pano azul. “Estamos sem café”, informa a atendente. Paciência. “O senhor deseja alguma outra coisa?”, “Por enquanto, não, obrigado”. Me sento numa cadeira alta, de madeira escura e metal claro e almofada entre o laranja e o marrom claro. O balcão de madeira lisa, envernizada me serve de apoio aos cotovelos e antebraços. Uma barra circular de metal reluzente pouco acima do chão sustenta meus pés que batem num cacoete maniático e hiperativo. Recuperando-me do baque da ausência do café, passo os olhos pela parede esverdeada ao fundo, atrás da pia e balcão internos: de um verde claro, entre verde-chá, esmeralda, desbotado, fantasma e menta. Nunca fui bom com cores… Continuar lendo

O Sorvete

o sorvete

Eu andava pelas ruas rumo ao centro da cidade naquele excessivo dia quente de inverno. O sol já havia passado das cinco da tarde, mas ainda se fazia intenso. De repente, me deparo com um rapaz, em torno dos vinte anos, sozinho, que vinha andando na direção oposta. Ele estava cm um sorvete de casquinha na mão. Comia-o com uma daquelas “pazinhas” próprias a isso, no entanto, com certa dificuldade.

Complicando-se na dificultosa atividade, dá um longo suspiro, abaixa a mão portadora da pazinha e lambe o sorvete. Nem havia ainda acabado a ação e, com a língua ainda para fora, levanta os olhos, observando se alguém o observava. A vergonha tracejou-se claramente naquela cara barbada e extremamente infantilizada pela posição meio cabisbaixa, a boca aberta, a língua para fora, os enormes olhos arregalados que olhavam para cima, perscrutando por desconhecidos olhares reprovadores ou zombeteiros. Continuar lendo

O Nome

Entramos no ônibus naquele final de tarde. Um dia de outono. O sol já baixava e refletia amareladamente nas ainda verdes folhas dos áceres do campus. Sentamos nas duas poltronas à esquerda, na última fileira. Em torno de uma hora de viagem estava à nossa frente.

Conversamos sobre tudo e qualquer coisa (pedir-me para lembrar especificamente seria exigir demais de uma memória não tão boa). Bate-papos. Papos bobos. Conversas ao vento. Quotidiano. E os centímetros começavam a tornar-se metros, que viriam a tornar-se quilômetros, enquanto eu não conseguia olhar para ela devido ao baixo sol, na direção dos meus olhos. Ah, sim, ela estava ao lado da janela. Continuar lendo

Certezas Mitológicas

Tinha acabado de assistir a uma palestra sobre Câmara Cascudo e o folclore brasileiro. Depois de terminada a fala, mais tarde, e enquanto eu tomava banho, peguei-me pensando sobre o que foi dito e seu significado.

Cascudo era um crente. Não no sentido hoje dado à palavra, mas no sentido original: aquele que acredita em algo. Muito mais que isso, ele acreditava na crença. Dizia que o inteligente acredita, tem superstições, enquanto o idiota duvida de tais crenças.

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Fim de Verão

21:36. Tinha acabado de olhar os ponteiros, ao passar por uma casa bem iluminada que mo permitia fazê-lo. A noite estava escura. Sem estrelas e com um luar que só se fazia presente através do reflexo de sua luz nas nuvens que o encobriam. A lua mesmo não se podia ver. Alguns (muitos) relâmpagos quando saí de casa mais cedo confirmavam as previsões atrasadas a alguns dias.

Nos últimos dias parece que o verão fez incrível força para atestar sua presença. “Ainda estou aqui!”, parecia gritar. E minha pele ouvia em alto e bom sol. Um calor talvez não tão quente quanto os 55 graus a que chegou uma cidade do estado nesse verão, talvez mais quente que o real pela esperança da nova estação. Tão aguardada!

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