A Tragédia Literária

ilusões perdidas

Honoré de Balzac nasceu em Tours, região central da França, em 20 de maio de 1799. Teve uma prolífica vida literária e uma vida pessoal e financeira conturbada. Investiu pesado na carreira de editor e impressor de livros, aplicação que não vingou e lhe gerou várias dívidas, além de um rico material utilizado por ele em suas obras. Teve várias amantes, incluindo uma condessa de origem polonesa, admiradora de seu trabalho, com quem casou, já no fim da vida. Morreu em Paris, em 1850, aos 51 anos.

Sem dúvida, Balzac é um dos maiores escritores de todos os tempos. Sua obra magistral contém mais de cem livros, sendo que 88 deles (a maioria romances) constituem A Comédia Humana. Este conjunto, que surpreende pelo título (uma referência direta à Divina Comédia, creio) e que espanta pelo número, basicamente inventou o século XIX e pode ser tomada como exemplo basilar de uma estética em transição.

O ideal Renascentista de exatidão à natureza na arte entra em colapso com o advento da fotografia, a partir da segunda década do século em questão. Essa transformação no paradigma de uma filosofia da arte pode ser notada em uma das frases de Balzac no conto A obra-prima desconhecida: “a missão da arte não é copiar a natureza, mas exprimi-la”.

Com isso em mente, o autor busca não uma história fantasiosa, com relações fora do comum, mas um espelho da realidade. Não simplesmente uma cópia ou aprimoramento dos moldes oferecidos pela natureza, mas um olhar para a natureza humana em sociedade, para os costumes, aparências, sentimentos e necessidades advindos de uma transição nas relações de poder, efeito de um capitalismo em ascensão.

Estes aspectos podem ser vistos claramente em Ilusões Perdidas. O romance, dividido em três partes, conta a história de Lucien Chardon de Rubempré, um jovem poeta de província com sonhos de reconhecimento literário e ambições de riqueza e estima na utópica capital francesa. Suas esperanças (ou ilusões) são gradativamente aniquiladas (ou perdidas) conforme convive e conhece a verdadeira sociedade parisiense.

Além de Lucien, existem diversos outros personagens, tanto na província, quanto na capital. A narrativa, em verdade, nem começa em Lucien, mas em Jérôme-Nicolas Séchard, pai de David Séchard, amigo e quase que total contraposto de Lucien. O pai Séchard possui uma tipografia, com a qual Balzac inicia sua história, que deixa para seu filho sob um contrato nada agradável, o que começa a revelar a relação entre pai e filho dos Séchard. David, tão sonhador quanto Lucien, porém mais resignado, retirado das confusões da capital, busca o melhoramento das técnicas de impressão. No entanto, será arrastado pelos acontecimentos e consequências dos atos de seu amigo.

Apesar de numerosos e extremamente diversos, todos os personagens têm um elo: Lucien. Ele é o foco da história. O poeta sonhador que deixa a província rumo à capital, motivado por paixões e ambições de amor, poder e literatura e que acaba sendo engolido pela sociedade parisiense. Logo que chega, Lucien é atraído pelas belezas e facilidades do jornalismo. Belezas que Balzac critica duramente em sua escrita: “Um jornal não é mais feito para esclarecer, mas para adular opiniões”.

Atraído por um mundo de poder e facilidades, Lucien envolve-se com jornalistas, atrizes de teatro, impressores e comerciantes, tentando, por meio de seu talento literário na página do jornal, alavancar sua carreira como escritor. Tragado pela real aparência de suas escolhas fantasiosas, Lucien pode ser visto como o oposto de Balzac: um gênio que se entregou, invés de lutar; um abraçou o que o outro repudiou e a vitória de um indicou o insucesso do outro. Talvez porque o caminho rumo à poesia seja árduo. Talvez porque, como disse Balzac, “o gênio umedece suas obras com suas lágrimas (…). Aquele que deseja se elevar acima dos homens deve se preparar para uma luta, não recuar diante de nenhuma dificuldade. Um grande escritor é um mártir que jamais morrerá, eis tudo”.

BALZAC, Honoré de. Ilusões perdidas. São Paulo: Abril, 2010. (Clássicos Abril Coleções; v. 11 e 12).

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