A Tragédia Literária

ilusões perdidas

Honoré de Balzac nasceu em Tours, região central da França, em 20 de maio de 1799. Teve uma prolífica vida literária e uma vida pessoal e financeira conturbada. Investiu pesado na carreira de editor e impressor de livros, aplicação que não vingou e lhe gerou várias dívidas, além de um rico material utilizado por ele em suas obras. Teve várias amantes, incluindo uma condessa de origem polonesa, admiradora de seu trabalho, com quem casou, já no fim da vida. Morreu em Paris, em 1850, aos 51 anos.

Sem dúvida, Balzac é um dos maiores escritores de todos os tempos. Sua obra magistral contém mais de cem livros, sendo que 88 deles (a maioria romances) constituem A Comédia Humana. Este conjunto, que surpreende pelo título (uma referência direta à Divina Comédia, creio) e que espanta pelo número, basicamente inventou o século XIX e pode ser tomada como exemplo basilar de uma estética em transição. Continuar lendo

O Quixote Brasileiro

policarpo quaresma tratada

O Modernismo foi um movimento literário e artístico brasileiro que buscava um retorno às raízes, uma inspiração nos aspectos mais próprios da cultura e realidade brasileiras. Foi inaugurado com a Semana de Arte Moderna de 1922 e deu início a uma nova fase na literatura e artes plásticas do país, separando-as das tradições acadêmicas e buscando libertar a criação e a pesquisa estética.

Um dos escritores que pode ser considerado um prenunciador deste movimento é Lima Barreto. Nascido no Rio de Janeiro a 13 de maio de 1881, Afonso Henriques de Lima Barreto é hoje considerado um autor clássico da literatura brasileira. Publicou várias peças, entre romances, artigos, crônicas, contos e sátiras. Continuar lendo

O Espelho do Real

o vermelho e o negro

Capa de edição francesa rara, ilustrada, de 1922, de O vermelho e o negro

“Pois bem, senhor, um romance é um espelho que se carrega ao longo da estrada. Tanto pode refletir para os seus olhos o azul do céu como a imundície do lamaçal da estrada. Por acaso o homem que carrega o espelho em sua sacola poderia ser acusado de imoral? Seu espelho mostra a sujeira e o senhor acusa o espelho? O senhor deveria acusar o longo caminho onde se forma o lamaçal e, sobretudo, o inspetor das estradas que deixa a água apodrecer e o lodo se acumular.” Esta é uma metáfora utilizada por Stendhal em seu clássico O vermelho e o negro. Um dos primeiros aspectos que se pode notar, assim, é a utilização de tópicos do contexto político na obra. Continuar lendo

Paixão e Simplicidade

Orgulho e preconceito

Frontispício da 1ª edição de Orgulho e preconceito (1813)

Orgulho e preconceito é a principal obra de Jane Austen, uma das maiores representantes do classicismo inglês e um clássico da literatura mundial. É um retrato da realidade inglesa do século XVIII. Uma obra direta, concisa, mas não talhada; essencial, por assim dizer. É fruto do período de maturidade literária da autora e traz os personagens Elizabeth Bennet e Fitzwilliam Darcy, protagonistas da trama, como duas das criaturas mais completas da literatura universal, conforme afirmou Otto Maria Carpeaux.

Jane Austen nasceu em Steventon, a 16 de dezembro de 1775. Filha de um reverendo, possuía seis irmãos e uma irmã. Estimulada desde cedo pelo pai nos caminhos literários, começou a escrever pequenas histórias e algumas peças durante a adolescência. Sua obra se resume aos temas relações familiares, noivado e casamento, não por isso deixando de ser original. Continuar lendo

Sobre Penas e Espadas

Dom Quixote

Página de rosto da 1ª edição de D. Quixote (1605)

Quanta arrogância achar-se capaz de criticar ou sequer discorrer sobre um dos maiores clássicos universais! E inutilmente! O que mais haveria para dizer sobre o romance mais lido de todos os tempos? Como falar sobre o Quixote de Cervantes?

Sempre há o que falar sobre o imponente Engenhoso Fidalgo Dom Quixote da Mancha. Afinal, “Um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer”, segundo Italo Calvino. Quanto à minha capacidade de falar sobre ele, é discutível. Que sei eu perto do molde dos romances de ficção? Posso apenas apresentar minha limitada visão sobre o incrível universo quixotesco. Continuar lendo

O Ser e o Não Sou

aos 7 e aos 40

“Ser ou não ser, essa é que é a questão: / Será mais nobre suportar na mente / As flechadas da trágica fortuna, / Ou tomar armas contra um mar de escolhos / E, enfrentando-os, vencer?”. O monólogo de Hamlet, composto por Shakespeare, evidencia a dúvida do personagem em relação ao que fazer, após saber a verdade sobre a morte de seu pai. Em Aos 7 e aos 40 de João Anzanello Carrascoza ocorre uma dúvida semelhante: Sou ou não sou? Pergunta-se o protagonista.

Carrascoza nasceu em 1962, na cidade de Cravinhos, interior de São Paulo. Formou-se em comunicação social e publicou, em 1994, seu primeiro livro, Hotel solidão, obra que lhe rendeu o Concurso Nacional de Contos do Paraná. Assim se inicia sua extensa lista de publicações e prêmios vencidos. Continuar lendo

Por Mares Nunca de Antes Navegados

frontispício da 1ª edição de os lusíadas (1572)

Frontispício da 1ª edição de Os lusíadas (1572)

“Este receberá, plácido e brando,

No seu regaço o Canto que molhado

Vem do naufrágio triste e miserando,

Dos procelosos baxos escapado,

Das fomes, dos perigos grandes, quando

Será o injusto mando executado

Naquele cuja Lira sonorosa

Será mais afamada que ditosa.”

Os versos acima compõem a estrofe de número 128 do canto X de Os Lusíadas, de Luís de Camões. Narram um naufrágio enfrentado pelo poeta no rio Mekong, no sudeste asiático. Nesta ocasião, Camões se salva em uma tábua, levando consigo apenas o manuscrito já iniciado de sua maior epopeia. Continuar lendo

As Metáforas da Ópera

ópera de sabão

 

1954. Vargas se suicida. Mas esse não é o foco. Claramente esse fato foi o estopim de toda a trama folhetinesca e radio novelesca de Marcos Rey, Ópera de sabão, mas não é o importante. Como o título sugere, a trama segue o ritmo e estilo das radionovelas, em inglês, soap operas (óperas de sabão). A expressão surge devido aos vários comerciais de patrocinadores das novelas, em geral, marcas de sabão. Mas, não, o sabão também não é importante. O que importa, talvez, seja a experiência do autor em radionovelas. Certamente isso deu tom particular à obra. Continuar lendo

Linhas Invisíveis

Onze

“Um fio vermelho invisível que conecta os que estão destinados a conhecer-se, independentemente do tempo, lugar ou circunstância. O fio pode esticar-se ou emaranhar-se mas jamais se quebrará”. Esta é a antiga lenda chinesa do Fio Vermelho do Destino (Akai Ito). O romance Onze (1995), de Bernardo de Carvalho, também possui um fio conector invisível e segue o mesmo padrão.

Bernardo de Carvalho é carioca. Nascido em 1960, é escritor e jornalista. Debutou sua carreira literária em 1993 com seu único livro de contos, Aberração. Continuar lendo

Labirintos Internos

Barreira Imagine-se dentro de um carro que passa rapidamente por uma bela estrada. Sua visão percebe as coisas na mesma velocidade do automóvel. Certamente não conseguirá captar tudo na primeira vez. Imagine que esse carro para em frente a uma porta. Você desce, se aproxima da porta e entra onde quer que ela dê. Um labirinto se abre à sua frente. Você começa a se aventurar por ele. As muitas esquinas e curvas lhe levam a lugares que lhe dão a sensação de já percorridos. Você se sente andando em círculos, se sente perdido. Mas continua a caminhada e a procura pelo centro, até que o encontra. Sobe até um segundo nível que permite a visão de todo o labirinto e percebe que todas as voltas e esquinas foram necessárias para que você chegasse ao centro. Nenhuma em excesso. Nenhuma em falta. Continuar lendo